Avanço da indústria 4.0 demanda planejamento energético para data centers

Em todo o mundo a indústria vive uma mudança comparada a uma revolução. Conceitos como automação, inteligência artificial, Internet das Coisas, big data, e análise de dados impulsionam fábricas mais inteligentes, eficientes e adaptáveis. Um dos desafios neste contexto é a necessidade de data centers, espaços físicos de armazenamento de dados que demandam muita energia.

Comparada a uma nova revolução industrial, a chamada Indústria 4.0 avança, prometendo mais eficiência energética e melhor desempenho para a produção, com avanços em robótica e inteligência artificial. Para que isso aconteça, todos os processos automatizados precisam de dados, característica da era da informação.

Os dados que impulsionam um novo cenário industrial precisam de um componente importantíssimo: um espaço para armazenamento dessa informação, que se torna ainda mais fundamental com o avanço da inteligência artificial. Esse espaço é chamado de nuvem.

O gerente de monitoramento e controle da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Rodrigo Pastl Pontes, explica o conceito. «A Indústria 4.0 oferece uma flexibilidade que atende em tempo real aos requisitos do cliente, permitindo que a empresa se reorganize constantemente. No entanto, para isso, é imprescindível contar com data centers seguros. Aqui entra a questão da segurança e da interoperabilidade, que são fundamentais para a melhoria das empresas». 

Masaru Kamikura/Flickr - Google Data Center

Os servidores ou data centers são espaços físicos que guardam a informação de dados de  toda a rede do planeta. Hoje eles estão espalhados pelos continentes, precisam estar ligados 24 horas por dia e manter uma temperatura que preserve a qualidade dos computadores, o que exige muita energia.

«Para explicar de forma mais acessível, um data center pode ser considerado um grande ‘cérebro digital’. É uma vasta rede de computadores que trabalha em conjunto para armazenar, processar e compartilhar uma enorme quantidade de informações. Podemos compará-lo a uma biblioteca, mas em vez de livros, ele guarda dados digitais, como vídeos, fotos, músicas e arquivos de aplicações. Empresas de diversos setores, especialmente bancos e governos, precisam de data centers para garantir que suas operações ocorram de forma rápida e eficiente», aponta o João Xavier, diretor de Relações Institucionais da  Associação Brasileira de Data Center (ABDC).  

Essa demanda pode chegar a 1.050 terawatt-hora em 2026, o que equivale ao dobro do que o Brasil consome por ano, segundo relatório da Agência Internacional de Energia (AIE). 

Para que o usuário possa dar play no filme favorito em algum streaming, ou para que uma indústria 4.0 possa manter sua operação, é necessário que o armazenamento de dados esteja rápido e disponível.

«Esses centros permitem o funcionamento de aplicativos e sites, oferecendo uma gama de possibilidades, como streaming de vídeo. Por exemplo, quando usamos o WhatsApp ou assistimos ao YouTube, essas plataformas operam a partir de data centers, permitindo que a comunicação aconteça sem interrupções. A missão de um data center é garantir a disponibilidade de informações 24 horas por dia, 7 dias por semana, 365 dias por ano»,  diz Xavier. 

Energia para uma nova indústria

De acordo com o Balanço Energético Nacional 2024, divulgado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) em parceria com o Ministério de Minas e Energia (MME), a indústria consome cerca de 31% da energia produzida no Brasil. É o segundo setor com maior consumo, atrás de transportes. 

Com a Indústria 4.0 há expectativa de mais eficiência energética nos processos, além de outras vantagens como diminuição da poluição atmosférica e uso mais eficaz de matérias-primas. Por outro lado, os data centers passam a ser fundamentais. 

Os últimos dados divulgados pelo «Monitor da Indústria 4.0», da International Market Analysis Research and Consulting (IMARC), e analisados pelo Observatório Nacional da Indústria da CNI, mostram que o mercado da Indústria 4.0 brasileiro atingiu US$ 1,77 bilhão em 2022, e existe a projeção de que chegue a US$ 5,62 bilhões em 2028. 

Diante da alta demanda da indústria e de outros setores, empresas de tecnologia estão se movimentando para potencializar seus processos com servidores robustos. A solução, portanto, tem sido buscar fontes próprias de energia. «A geração de calor pelos servidores requer sistemas de ar condicionado muito eficientes para controlar temperatura e umidade. Isso, por sua vez, demanda uma quantidade significativa de energia, e as operadoras de energia precisam ser capazes de atender a essa demanda», complementa Xavier. 

Pixbay - Imagem ilustrativa - Data Center

De acordo com a ABDC, em São Paulo existem quarenta e três data centers em operação, oito em construção e cerca de vinte planejados. Em Fortaleza, três estão em operação, dois em construção e mais dois planejados. No Rio de Janeiro, são onze em operação, quatro  em construção e oito planejados. Porto Alegre totaliza  três em operação  e apenas dois planejados.

A descentralização destes servidores é importante para diminuir a latência, o que significa tornar a interação do usuário mais fluida. A comunicação entre máquinas e usuários é fundamental, e ter data centers descentralizados melhora essa interação. «Imagine se todos os dados estivessem localizados apenas nos Estados Unidos; a comunicação seria ineficaz e com atrasos. A tendência atual é estabelecer data centers mais próximos dos usuários, o que reduz o tempo de resposta e melhora a experiência», observa Xavier. 

Amazon e Microsoft anunciaram investimentos robustos em energia no Brasil. O território do país é visto como um novo «paraíso» para as chamadas ‘fazendas’ de data centers, por ter sua matriz elétrica composta majoritariamente por energia renovável.

O Ministério de Minas e Energia está atento ao assunto. Em nota para Climate Tracker, o órgão afirmou que “o crescimento do setor de data centers no Brasil demonstra a capacidade do país de se consolidar como um hub tecnológico da América do Sul, impulsionado por um sistema elétrico robusto e predominantemente renovável».

Ainda segundo o Ministério, considerando apenas os pedidos para projetos de data centers que foram realizados entre maio e agosto de 2024, a previsão de demanda  pode chegar a 9 GW de energia até 2035. 

O consumo total de energia no Brasil deve crescer em média 2,1% nos próximos dez anos, aponta a projeção decenal da Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Mas considerando os planos para melhoria na eficiência do consumo, acredita-se que o gasto industrial possa ser reduzido em até 46%. 

Investimentos de Big Techs

A projeção da Amazon é investir R$ 10,1 bilhões no Brasil em até dez anos. Os valores representam expansão na infraestrutura e construção de data centers. A companhia afirma ter viabilizado projetos de energia renovável no país, incluindo parques solares e eólicos que juntos geram energia para abastecer até 100 mil lares brasileiros. A ideia da empresa é produzir a mesma quantidade de eletricidade consumida pelo grupo para manter sua operação em território nacional. 

A Microsoft também anunciou que irá expandir sua operação no Brasil e investir R$ 14,7 bilhões. Com data centers sediados em São Paulo e no Rio de Janeiro, a empresa agora tem um parceria com a AES Brasil para geração de energia eólica por 15 anos, em um parque localizado no estado do Rio Grande do Norte.

Energia nuclear é considerada para suprir demanda

Em outubro de 2024 o Google afirmou que irá investir em energia nuclear na operação dos Estados Unidos. A ideia do grupo é adquirir SMR (Reator modular pequeno, traduzido da sigla em inglês) ao invés de acionar grandes usinas. O projeto, inédito no âmbito corporativo e nos Estados Unidos, será gerido pela start up Kairos. O início das operações está previsto para 2030. 

Atualmente cerca de 80 projetos de SMRs estão em andamento no planeta, porém, segundo a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), apenas na China, Argentina, Rússia e agora os EUA. O Brasil ainda não tem pedidos de projetos de instalação. 

Para o presidente da Eletronuclear, Raul Lycurgo, a energia atômica é determinante para auxiliar no suprimento da demanda energética dos data centers. «Quando a gente fala de data center, ele está falando de energia firme, hidrelétrica com reservatório ou térmicas. Dessas térmicas, qual é a única que não gera gases de efeito estufa? É a nuclear», opina. 

No Brasil, é incerta a retomada das obras de Angra 3. O complexo, que conta com duas usinas ativas, representou 1% da energia brasileira em 2024.

Há quem discorde da retomada das nucleares para o cenário atual brasileiro. É o caso do Ricardo Lima, consultor especialista em energia. «Países que não têm alternativas podem se dar ao luxo de usar uma energia mais cara. Ela [nuclear] não é cara em termos de operação; o ciclo do combustível tem seu preço, mas o investimento de capital é muito elevado. Nós temos alternativas muito mais baratas do que nuclear: temos solar, eólica, hidrelétrica. O potencial dessas fontes ainda não foi nem arranhado. Outras fontes podem suprir a demanda, energias mais baratas que a nuclear para esse consumo elevado», aponta Lima.

O responsável pelo lixo radioativo do Brasil é a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), mas até o momento não há um repositório unificado para o controle de tais dejetos, o que pode ser um empecilho para o avanço das nucleares.

«A outra questão são os dejetos nucleares. Nas costas da Califórnia, barris com detritos eram jogados nas águas. É um problema sério. Um resíduo de urânio pode durar centenas de anos. São argumentos importantes», conclui Lima.

Agência Brasil - Tomaz Silva/Agência Brasil - Complexo Nuclear Angra dos Reis

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